quarta-feira, 14 de novembro de 2007
UMA AVENTURA NA NOITE
Encontrei-me ( pensando sempre em Monica Vitti com os seus cabelos loiros olhando a estranheza da vida da janela de um comboio) num sítio estranho do Bairro Alto: a travessa das Bolas. Aí, à frente de um muro esquisito composto por bolas incrustadas num painel granítico, lá estava ela, de seios de fora, Hernia, a jovem vinda da Morávia e que falava só alguns picles de português. Aproximei-me e vi que a sua beleza era como um doce conventual, antiga e serena.
- Gosto bravo de make amor com muribundos ! disse ela para me experimentar.
A União Europeia pagava rios de dinheiro a jovens para eles através do programa Erasmus convidarem a convivialidade à mesa da curiosidade. Ma só a sexualidade era chamada e se apresentava quase sempre com o seu manto espesso e complicado de lontra.
Levei-a nesse estado catatónico a uma mercearia da rua da Rosa ( aberta a essas horas tardias porque o dono acabava de morrer e entravam os cangalheiros ) e de uma prateleira retirei uma garrafa de azeite Gallo. Deixei o dinheiro no balcão e transitei com Hernia para uma transversal que ia dar à rua da Atalaia. À porta de uma lojeca que vendia preservativos de todos os tamanhos e feitios deitei o primeiro pingo desse azeite virginal e soberbo que é a glória do nosso país no seio direito da checa. Ela não deu um gritinho, só riu com esse riso alimentado desde a infância de cogumelos. Depois chupei-o com a ânsia de um homem que sempre viu filmes de cowboys na vida.
A noite era nossa e depois de termos apostado forte e perdido numa banca portátil que uns africanos mantinham com um só baralho no miradouro de Santa Catarina descemos para a Bica. Neste bairro labiríntico fácil foi encontrar uma outra mercearia onde comprei um bocado de sabão Clarim. No fontanário público ela sentou-se na escadas comidas pelo tempo e eu de joelhos religiosamente lavei-lhe a conaça com os seus pêlos postados como índios esperando uma diligência.
Ela ria agora como a trombeta que anuncia a chegada da sétima cavalaria para terminar a chacina. Beijei-a na boca molhada enquanto com um dedo esguio me assegurei que a sua vagina estava chuvosa. Levantámo-nos depois e começámos a subir a ladeira dos melhores sonhos de Lisboa e que nos ia instalar na linha imorredoura do eléctrico 28. Direcção sexo súbito.
- Vulcano ! murmurou ela de repente.
Não sei se ela invocava o vulcão da sua cona da Boémia com os seus cinco casos nominativos. Só sei que ela me pegou na mão, entrou num pequeno restaurante, fomos à cozinha, e aí ela levou os nossos dedos unidos à chama azul transparente. Queimámo-nos ligeiramente. Mas eu sabia que este gesto à beira da velha marca mundialmente conhecida era a união que nos faltava para sermos felizes em qualquer lado. Rejubilava interiormente.
Perdi-a quando descíamos a Calçada do Combro. Eu fiquei para trás para ver o horário da biblioteca do Camões onde devia consultar um livro sobre cogumelos checos que crescem nas florestas da Morávia e gritando o seu nome ninguém me respondeu: Perguntei a várias pessoas que subiam se tinham visto uma estrangeira de seios à mostra mas as pessoas riram de mim...
Fui a um bar do Poço dos Negros beber uma aguardente que não imitava a slivovice e regressei a casa de táxi. Consultei o relógio no banco fofo. Tinham passado noventa minutos desde que encontrara Hernia e a perdera para sempre. Era o tempo de um bom filme...Mas como eu não gosto de encontrar duas vezes as mesmas jovens perturbadas e anacronicamente felizes aqui fica também a palavra FIM.
segunda-feira, 21 de maio de 2007
A Ponte Submersa
terça-feira, 24 de abril de 2007
DIÁRIO INTERMITENTE - IV
Tenho a certeza que este livro se vai vender bem, ultrapassando todas as expectativas. O que é preciso é que os jovens falem nele, o resto é comigo. A minha literatura com osso continua a propor à juventude o caminho do prazer, do desejo, do riso e da alegria, do sexo...O que é preciso é que o descubram nas prateleiras, nas bocas dos amigos, digo eu aos estorninhos.
terça-feira, 17 de abril de 2007
DIÁRIO INTERMITENTE - III
Não tenho tempo de lhe responder, um mendigo pede-me dinheiro para uma sopa.
segunda-feira, 9 de abril de 2007
DIÁRIO INTERMITENTE - II
É verdade. Mas não é esse o necessário prelúdio a todos os jogos e vertigens do amor ? A bebida não é o aperitivo da morte ? E o digestivo da ressurreição pós- copular ? E a antecâmara da alegria mais viva ?
Bebi sempre antes de foder e isso resultou sempre. Ver o meu livro “ Coisas do Vinho “...
quinta-feira, 29 de março de 2007
DIÁRIO INTERMITENTE - I
segunda-feira, 12 de março de 2007
A DUPLA VONTADE DE MONSIEUR RAMOS - Conto Inédito III
Se estás viva, onde estás tu hoje Sandra?Hoje, enquanto bebia café sem açúcar, entre dois capítulos de um novo romance, pensei que a vida é sempre mágica e defensável, co-autora fiel e volante, como os conirrostros que voltam todos os anos ao sítio das nossas recordações sem fim.
quarta-feira, 7 de março de 2007
A DUPLA VONTADE DE MONSIEUR RAMOS - Conto Inédito II
Andei três meses com Sandra e um dia cortei as nossas relações porque já não tinha tempo para nada. Nem para meter cartas, nem para escrever. Vocês não sabem o que é uma mulher com duas vaginas, não se tem um fim-de-semana livre, nem domingos, nem feriados. É-se um autêntico escravo. Os jornais, que eu lia com voracidade, deixei-os de ler e o mundo para mim resumia-se agora à tremenda complexidade de duas vaginas molhadíssimas como os pinheiros do Caramulo no inverno se tornaram autênticos labirintos mitológicos. Quanto a ela, depois da doutrina sexual, quis endoutrinar-me religiosamente. E abrindo o livro de Petrópolis lia-me a batalha de Gelboé e a morte de Saul, Siceleg destruída e a inobservância do sábado, ou a elegia sobre a ruína de Jerusalém, Elias anuncia uma seca ou Jesus e Nicodemos... Terminámos quando ela um dia me começou a ler o Tobias, que é um dos sete livros deuterocanónicos...
quinta-feira, 1 de março de 2007
A DUPLA VONTADE DE MONSIEUR RAMOS - Conto Inédito I
quarta-feira, 7 de fevereiro de 2007
CARTA IV
Isto é, ver o mar por detrás das torres das Amoreiras!
Ou simplesmente : meter partículas de realce na vida agafonhada que transmite o sarampo Belmiro!
Ou ainda melhor: introduzir em cada minuto de sol a gota miraculosa de orvalho que é apanágio das manhãs de inverno e que para o poeta é ao mesmo tempo esperma dos puros e molhadela vaginal da moçona excitada de Santo António dos Cavaleiros!
E no final : curtir a morte como se fosse outra cena qualquer!
Já compreenderam: não sou pelo totalitarismo da juventude mas pelo individualismo da juventude!
E contra a tua catividade!
segunda-feira, 5 de fevereiro de 2007
CARTA III
Talvez ela estivesse contente de ter encontrado alguém a seu gosto, contente em juntar o útil ao agradável. Eu estava cansado, muito bebido, e sem vontade de fazer sexo. Mas os olhos dessa puta ocasional que me contou ali rapidamente a sua história comoveram-me. Viera prostituir-se ( dizia ela ) porque precisava de pagar a renda do quarto. E levei-a para minha casa. Uma vez chegados ela despiu-se logo. O seu corpo parecia o de uma criança, magríssimo. O seu corpo realmente não me excitava mas os seus olhos brilhavam como se um dos melhores museus do mundo estivesse em chamas. Foi isso que me fez entesar e gozou duas vezes. A relação humana que tivemos (de grande sinceridade, de grande proximidade, de grande honestidade ) fez-me sentar à mesa da minha cozinha para meditar depois de ela ter partido e de ter feito sexo comigo durante meia hora : afinal como eu não podia foder-lhe os olhos, humildemente optara pela sua pequena vagina lubrificada. Mas fora pelos seus olhos devido a eles pelos seus olhos mais negros que a noite embebedada que eu empreendera essa relação impossível de outra maneira...
quarta-feira, 31 de janeiro de 2007
CARTA II
Sois tão sonhadoras que só sonhais com o mesmo sonho, casar com um homem rico, belo e estulto! Ou então com um primo que se suicidou na sua tenra maioridade!
Sois tão sonhadores que já escolhestes o nome da vossa companheira: chamar-se-á Sandra e terá dez cartões de crédito! Quanto aos pais são farmacêuticos!
Vejo-vos desamadas, indiferentes, desprogramadas, vejo-vos materializados até à rótula do bife, grosseiramente engordados nos pensamentos e nas obras, redondamente enganados mas felizes, e com eles plantados na testa, e mudo de passeio porque há muito tempo já que me divorciei da vida monogâmica, fácil e bacana!
Primeiro parêntesis purulento (Portugal --- porque é que as conas desaparecem sozinhas? --- não é um grande mistério).
Segundo parêntesis purulento (Vós não bebeis, engolis! Vós não falais, monologais! Vós não fodeis, gritais com medo e molhais por obrigação, ejaculais!).
segunda-feira, 29 de janeiro de 2007
CARTA I
Vejo-vos no Bairro Alto, nas Docas, no Lux, na Capital, na Biqueense, nos bares do Cais do Sodré, na esplanada do miradouro da Graça, em Lisboa, vejo-vos no Porto, na Ribeira, nas boates da Foz, vejo-vos nas Docas Secas de Castelo Branco, nas tascas da Covilhã e nas suas duas mais famosas discotecas a Companhia e o Armazém (outrora fábricas de lanifícios ), vejo-vos na Zambujeira do Mar, em Albufeira, em Vilamoura, nos cafés de Lagos, e noutros pontos do país onde corre livremente a imperial a 1 euro e o shot fumante a 1 euro e meio e o meu coração põe-se logo a ganir de tristeza!
Sois tão terrenos, mais terrenos que os terrenos onde foi construída a Expo 98 --- hoje aos moscardos!
Vejo-vos na rua abraçados a lontras de minissaia, as vossas oportunistas de namoradas, vejo-vos no cinema beijando as mesmas interesseiras, nas sanduicherias volantes comendo com os olhos amostardados as vossas futuras esposas quase engravidadas, e rapidamente o meu sexo encolhe como uma bandeira no final de um dia feriado!
Sois tão convencionais, mais alinhados que as divisas de uma nova magala promovida a caba - miliciana!